O Google está prestes a destruir a internet?

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O Google Está Prestes a Destruir a Internet? | Como a nova era da Busca com Inteligência Artificial pode abalar o modelo econômico da web aberta

Em um cenário onde a internet moldou gerações, economias e até democracias, uma mudança silenciosa — mas profunda — está sendo liderada por um dos gigantes que ajudou a construir esse ecossistema: o Google. Com a introdução do chamado «Modo IA» (ou AI Mode) na busca, a gigante de Mountain View promete uma experiência revolucionária, mas especialistas alertam que os impactos podem ser devastadores para a estrutura da web aberta como a conhecemos.

O pacto não-escrito da internet está em risco

Durante mais de duas décadas, a internet operou sob um acordo tácito: os sites oferecem conteúdo gratuitamente, e os motores de busca — especialmente o Google — redirecionam os usuários para esses sites. A visibilidade proporcionada pelo Google era, para milhões de criadores de conteúdo, empresas, educadores, jornalistas e blogueiros, a principal forma de atrair audiência e gerar receita.

Estima-se que cerca de 90% das buscas na internet sejam feitas pelo Google. De cada 10 usuários que procuram algo online, 9 recorrem à ferramenta. Isso coloca o Google não apenas como um motor de busca, mas como o verdadeiro arquiteto da internet moderna.

Com a chegada do Modo IA, que substitui os tradicionais links da busca por uma resposta gerada por inteligência artificial, o que está em jogo é esse pacto histórico. Afinal, se a IA do Google já entrega uma resposta completa e detalhada, por que o usuário clicaria em um link?

Como funciona o Modo IA do Google?

Apresentado oficialmente por Sundar Pichai em maio de 2025, durante a conferência Google I/O, o Modo IA é uma evolução dos já conhecidos AI Overviews. Enquanto os Overviews resumem conteúdo no topo da busca, o Modo IA transforma a experiência por completo.

Quando ativado, o Modo IA apresenta um “miniartigo” redigido por IA como resposta principal à consulta do usuário. Essa resposta é construída a partir de múltiplas fontes, rastreadas e interpretadas por algoritmos, e é exibida de forma destacada — muitas vezes empurrando os resultados orgânicos para segundo plano.

Segundo Liz Reid, VP de Busca do Google, essa é «a reinvenção completa da busca». E, apesar de ser uma funcionalidade opcional no momento, Reid deixou claro: “Este é o futuro do buscador do Google.”

Impactos diretos no tráfego e na economia digital

Estudos preliminares conduzidos por empresas como BrightEdge e Amsive indicam que os AI Overviews já reduziram em até 70% a taxa de cliques nos links tradicionais, dependendo do tipo de busca. Em outras palavras, mesmo quando os links ainda estão visíveis, os usuários preferem ler a resposta da IA e seguir com sua vida — sem visitar os sites que originaram a informação.

Esse comportamento gera uma reação em cadeia: menos visitas significam menos receita com publicidade, menos assinaturas, menos compartilhamentos e, por fim, menos incentivo para produzir conteúdo original e de qualidade. Para os editores, jornalistas, educadores e criadores de conteúdo, isso representa uma ameaça existencial.

A web das máquinas: o novo paradigma

À medida que a IA assume a função de “narradora da internet”, muitos analistas falam do surgimento da web das máquinas: uma realidade onde os sites não são mais escritos para humanos, mas para robôs que vão extrair, processar e reempacotar a informação.

Demis Hassabis, CEO do Google DeepMind, afirmou recentemente que, no futuro, muitos editores sequer se preocuparão em publicar artigos acessíveis a humanos — eles irão direto para os modelos de IA.

Esse modelo levanta sérias questões:

  • Quem será o dono da informação?

  • Como os criadores serão remunerados?

  • Quem controla a narrativa?

O Google promete equilíbrio, mas não oferece dados

O Google afirma que seu objetivo é melhorar a experiência do usuário e criar novas formas de descobrir conteúdo. Em nota oficial, a empresa destacou que «continua enviando bilhões de cliques para a web todos os dias» e que “o tráfego gerado pelas ferramentas de IA é de maior qualidade”.

No entanto, a empresa se recusa a publicar dados que comprovem essas afirmações. Até o momento, não há transparência sobre quantos cliques os sites perdem ou ganham com o Modo IA.

Perda de diversidade e autonomia editorial

Para Gisele Navarro, editora-chefe do site HouseFresh, que publica resenhas de produtos para qualidade do ar, a perda de tráfego orgânico com a chegada da IA foi significativa. «O Google mostra nossos links, mas ninguém clica. Isso coincide com os Overviews», afirma.

Navarro acredita que estamos perdendo a diversidade da internet. “Antes, era como uma biblioteca aberta. Agora, é como perguntar algo ao bibliotecário e ele apenas te contar a história, sem te mostrar os livros”, disse.

A monetização está em xeque

Outro impacto direto é sobre os modelos de monetização. Com menos cliques, há menos visualizações de anúncios. Como consequência, a viabilidade de muitos projetos digitais está ameaçada.

Algumas empresas, como o New York Times e o Reddit, já estão licenciando seus dados para empresas de IA. Mas isso está restrito a grandes players. Pequenos e médios editores não conseguem negociar — e nem são convidados.

Segundo especialistas como Tom Critchlow, VP da Raptive, «esse modelo não é sustentável em larga escala. Ele cria uma internet para poucos.»

A alternativa: redes sociais ou extinção?

Diante da queda no tráfego orgânico, muitos criadores estão migrando para as redes sociais. Mas o ambiente ali é ainda mais volátil. Os algoritmos priorizam o conteúdo viral e superficial, deixando de lado o conteúdo aprofundado e informativo.

“Você é forçado a informar menos e vender mais”, diz Navarro.

A resposta dos editores e da sociedade

Organizações como a News/Media Alliance têm pressionado por regulamentações. Documentos revelados em processos judiciais nos EUA mostraram que o Google mudou silenciosamente suas regras, permitindo que o conteúdo dos sites seja usado para treinar IA, a menos que o editor remova seu site completamente da busca — o que, na prática, equivale ao suicídio digital.

Matthew Prince, CEO da Cloudflare, propôs bloquear rastreadores de IA e só liberar acesso mediante pagamento. «Os humanos devem acessar conteúdo gratuitamente — os bots devem pagar caro por ele», declarou.

O futuro é incerto, mas a mudança é inevitável

Apesar das críticas, o Google segue firme com o lançamento global do Modo IA. Sundar Pichai afirma que a ferramenta melhora a busca e é o que os usuários querem.

No entanto, como alerta Cory Doctorow, autor do livro Enshittification, talvez estejamos diante de uma “bostificação” da web — onde o conteúdo de qualidade é substituído por resumos genéricos, sem autoria clara, sem diversidade de vozes, e sem transparência.

Para ele, a crise atual pode ser uma oportunidade. “É uma chance de reconstruir a internet com novos valores”, diz.

Conclusão: destruição ou reinvenção?

A resposta à pergunta «O Google está destruindo a internet?» ainda está em aberto. Para alguns, o Modo IA representa um avanço necessário. Para outros, é a destruição de um ecossistema vital para a democracia, o conhecimento e a liberdade de expressão.

O que é certo é que estamos vivendo uma transição histórica. E como toda mudança radical, os impactos só serão totalmente compreendidos quando for tarde demais para voltar atrás.


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